MOLEIRINHA
domingo, setembro 21, 2003
  EMOCIONAL VS. RACIONAL
Há uns anos atrás assisti na televisão a um linchamento que nunca mais esqueci e que tem assombrado constantemente o meu pensamento racional.

A história conta-se em poucas palavras: dois individuos tinham cometidos um assalto e fugiram para uma aldeia do interior brasileiro. Entraram numa casa e mataram todos os que lá viviam. É montado um grande cerco policial e depois de muitas trocas de tiros, os ladrões rendem-se. A policia e alguma pessoas da aldeia entram na casa e verificam a carnificina que ali tinha sido cometida. Os populares enraivecidos reinvidicam os ladrões aos policias, que por estarem em número consideravelmente inferior, acabam por ceder.

O que se seguiu foi um festim demoniaco. Homens, mulheres e crianças batem nos dois homens de uma forma brutal e animal com tudo o que têm à mão: paus, pedras e punhos. Após longos e demorados minutos de gritos lascinantes e ossos partidos, os ladrões tombam no chão inanimados, cobertos de sangue.

Em voz-off, o repórter diz que o mais impressionante vai agora acontecer. Eu pensei que eles já estavam mortos....

Alguns populares derramam barris de gasolina sobre os homens que se mantêm quietos. Alguém joga um pano a arder para atear o combustivel. Imediatamente uma chama engole os dois corpos que se contorcem numa uma dança horripilante acompanhada de gritos de sofrimento atroz. Algumas crianças jogam pequenas pedras às cabeças dos homens, como se de uma brincadeira se tratasse. Os populares continuam a dar pontapés nos corpos que ardem. Passados alguns minutos o silêncio invade o lugar e os populares dispersam.

Olho por Olho, Dente por Dente. Há quem defenda este principio. Eu próprio tenho alguma dificuldade em dizer como me comportaria se fizessem mal aqueles que me são queridos. Emocionalmente parece-me que a vingança é justa.

No entanto, racionalmente não consigo conceber uma sociedade onde seres humanos em grupo se comportam de forma tão animal e selvagem.

Até hoje e sobre esta matéria continuo sem saber se sou na realidade um racional emocional ou um emocional racional.
 
sábado, setembro 20, 2003
  SIC SÉRIES
Na minha casa vemos de tudo um pouco em termos de televisão: a SIC Noticias, a SportTV, o Disney, os Lusomundo e mais meia duzia de canais. Mas se tivesse que nomear um só canal seria a SIC Mulher.

As preferências da minha mulher mas também as minhas vão para um conjunto de séries americanas que seguimos fielmente neste canal. Resta dizer que cá em casa não vemos nem novelas brasileiras nem “ficção nacional”.

Estou convencido que a SIC Mulher foi um erro de casting. A SIC e a TV Cabo tinham acordado em abrir um novo canal orientado para a mulher. Como estamos em tempo de crise, ninguém quis abrir os cordões à bolsa para gastar em programação e eis que surge um canal só com programas enlatados e a maioria nem sequer original em Portugal.

Entretanto como este canal já andava a ser anuciado há tanto tempo e já existiam contratos de publicidade com grandes investidores no target das mulheres, toca a lançar o canal mesmo assim.

Os nossos dias são cada vez mais curtos e as noites nem se fala. Quem é que tem 1h30m ou até mais para ver filmes durantes os serões semanais? Estou convencidos que as pessoas tem maior disponibilidade para verem uma ou duas séries para acompanhar todos os dias. Para aqueles que não se revêem nem na ficção nem na paródia nacional, as séries americanas – dramáticas e comédias - são de excelente qualidade e garantem quase sempre um excelente serão.

Lanço desde já o meu apelo a Graça Bau da TV Cabo para ver o que pode fazer. Estou convencido que se o canal se chamasse SIC Séries havia mais homens a admitir que vêem o canal!
 
sexta-feira, setembro 19, 2003
  TRêS IRMÃOS
Não é possível passar pela Rotunda do Marquês de Pombal em Lisboa sem reparar num grande cartaz que anuncia que, em breve, ali irá surgir um novo túnel. Foi uma das grandes promessa do actual Presidente da Câmara de Lisboa, Pedro Santana Lopes, nas últimas eleições autárquicas e que está ai para ser cumprida.

As obras do Túnel do Marquês já começaram. Um projecto que depois de muito discutido e planeado, pode agora passar do papel para a realidade.

Há aqueles que são contra e aqueles que são a favor. É sempre assim. Lembram-se da Expo? Felizmente que há aqueles que vão mesmo com as coisas para a frente. Quando hoje passeio pela Expo, penso na sorte que têm os meus filhos porque nunca vão conhecer a lixeira que lá havia antes.

Por isso saúdo Pedro Santana Lopes e o “seu” Túnel do Marquês de Pombal. Vamos ter muitos dias para pragejar por causas das obras e das filas que estas vão provocar, mas estou convencido que as vantagens e os benefícios do Túnel serão bem visíveis, e que quando fôr inaugurado vamos ficar todos satisfeitos: aqueles que foram a favor e também aqueles que foram contra.

Os portugueses gostam dos politicos com "obra".

A revista Visão publicou esta semana uma sondagem onde Pedro Santana Lopes é preferido a António Guterres como candidato à Presidência da Républica. Aparentemente os portugueses acreditam mais nele....

Segundo as mesmas sondagens, se as eleições fossem hoje, seria Cavaco Silva a vencer estas eleições. Parece que as obras do Professor ainda estão no coração de muitos portugueses.

Há um outro português que também ficou no coração de muitos portugueses pelas obras que executou: Sebastião José de Carvalho e Melo, Primeiro Ministro de Portugal no reinado de D. José I.

É óbvio que falo do Marquês de Pombal. O tal do túnel...

Para muitos, o Marquês de Pombal foi o grande reconstrutor da cidade de Lisboa após o grande e destruidor terramoto de 1755.

Mas o Marquês de Pombal, foi também uma das figuras mais controversas e carismáticas da História Portuguesa. É sabido que era um déspota que governou para o povo, mas sem o povo. De onde vinha o poder absoluto do Marquês?

Hoje encontrei uma resposta provável. Por ocasião de um almoço no Palácio dos Marqueses de Pombal, em Oeiras, tive oportunidade de conhecer uma obra de arte que ilustra bem o poder e controlo do Marquês de Pombal na Sociedade Portuguesa do século XVIII.

Os interiores do Palácio e seus vários salões são revestidos por magníficos lambris de azulejo e delicados estuques. Contudo, a chamada “Sala da Concordia” destaca-se devido a uma decoração diferente das demais. O tecto é preenchido por um grande retrato a óleo dos três irmãos (Paulo de Carvalho e Mendonça à direita, Francisco Xavier de Mendonça e Furtado à esquerda e ao meio o Primeiro-Ministro o Marquês de Pombal). Os irmãos abraçam-se formando o número oito deitado (infinito). É uma obra que além de bela, está carregada de significado. Diz a lenda que era ali que os três irmãos se encontravam sempre que tinham posições discordantes. Na Sala da Concórdia invariavelmente passariam a estar de acordo.

A imagem dos três irmãos é muito interessante e ao mesmo tempo reveladora: Paulo foi inquisidor-mor e mais tarde Cardeal. Controlava portanto a igreja. Francisco era Militar e o equivalente ao actual Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. Controlava portanto o Exército e a Armada. Por fim, Sebastião José era o Primeiro-Ministro de Portugal. Que mais era preciso para governar o país? Não se pode dizer que fosse um sistema democrático, mas isso também não interessava nada.

Deixo-vos com uma pequena adivinha: quem foram os “três irmãos” do século XX em Portugal?
 
quarta-feira, setembro 17, 2003
  SENTIMENTOS ESCONDIDOS
Hoje é quarta-feira. Desde há 7 anos que todas as quartas-feiras a minha filha mais velha vem jantar comigo.

Todas as quarta-feiras, vou buscá-la à escola, trago-a para casa, toma banho, revêmos os trabalhos de casa e jantamos. Pelas 21:30 tenho que a levar de volta a casa da mãe.

Desde que tem dois anos que seguimos religiosamente este ritual. Hoje, quando se despedia, disse-me “É sempre tão pouco tempo, pai. Não percebo porque não posso cá ficar mais tempo!”.

“É pouco tempo mas é o temos, filha. Por isso temos que o aproveitar bem” respondi.

A tristeza que sentia nos primeiros tempos de separação regressou subitamente. Foi como se tivesse aberto a caixa onde guardava as minhas angústias.

Abraçámo-nos e dei-lhe um beijo na testa, como sempre faço.

“Gosto muito de tí, pai”.

“Eu também, filha.”.

Há 7 anos atrás quando, após um penoso divórcio litigioso, o juiz do tribunal de familia deliberou que em relação ao pedido de custódia que eu tinha apresentado, só iria poder ver a minha filha às quartas-feira e aos fins-de-semana alternados, fiquei revoltado e angustiado. Senti na pele a injustiça que se abate sobre os pais que se separam das mães. Todo o processo está subvertido para que seja sempre a mãe a ficar com os filhos. Sobram para o pai alguns escassos momentos que são suposto ser suficientes para encher o vazio que provocam. Os primeiros tempos são muito dificeis. Cada vez que voltava a casa depois de deixar a minha filha em casa da mãe, a angústia tomava conta de mim. Chorei vezes sem conta. Depois fui-me habituando e ao longo destes anos aprendi a esconder as minhas tristezas.

Entretanto também a minha vida mudou nestes anos: voltei a casar e tive mais dois filhos fantásticos. Formamos uma família equilibrada com muito amor, amizade, sáude e respeito mútuo. Tive também a sorte de encontrar uma mulher maravilhosa, a minha melhor companheira e amiga, que me ajudou a construir esta familia que tenho hoje. A sua dedicação e amor à minha filha têm sido um pilar fundamental para a estabilidade da nossa familia. A excelente relação que existe entre a minha actual mulher e a filha do meu primeiro casamento, foi crucial para mim.

Sei que a minha filha me ama a mim e aos irmãos dela. Sei que estes sentimentos se prolongam para a aquela que não sendo a sua mãe natural é uma pessoa muito especial na sua vida.

Apesar da angústia que me causa a separação diária da minha filha, todos os dias, dou graça a Deus, pela relação maravilhosa que tenho com ela e por saber que connosco, ela se sente verdadeiramente em casa.
 
terça-feira, setembro 16, 2003
  PASSADO ATRAIÇOADO
Durante praticamente toda a minha vida convivi de perto com a RTP. Não digo isto com sentido figurado. A minha mãe trabalhou mais de 30 anos naquela instituição.

Ainda me lembro do tempo em que os meus amigos me pediam para os levar aos ensaios do Festival da Canção. Certamente que hoje para os levar à noite da gravação, tinha que lhes pagar. Apesar de uma certa banalização da televisão, estou convicto que para muita gente este é um mundo distante e fascinante.

Talvez porque sempre convivi muito de perto com as pessoas que faziam televisão, percebi que as estrelas afinal eram pessoas como outras quaiquer. Por isso sempre encarei aquele mundo mágico de uma forma muito próxima e descontraida. O fascinio vai desaparecendo com o tempo. Contrariando o destino de muitos dos filhos dos funcionários, nunca pensei trabalhar na RTP.

Estas noticias que vieram recentemente à superficie e que lançam a suspeita da existência desde os anos 70 de uma rede de pedófilia na RTP, são um choque para quem, como a minha mãe, lá trabalhou dezenas de anos e nunca ouviu falar de tal coisa. A mera hipótese de que pessoas como Carlos Cruz ou outros seus colegas de trabalho possam ter cometidos estes crimes atraozes, têm de alguma forma desvanecido a imagem de encanto que a minha mãe guardava da RTP.

A minha mãe não conheceu outro trabalho na vida e viveu intensamente aquela casa. Tenho muita admiração pela minha mãe, pois invariavelmente sempre que os seus ex-colegas me falam dela, é sempre com extremo carinho e reconhecimento pela dedicação ao seu trabalho. Tenho a expectativa – talvez ingénua - de que este escândalo da pedófilia na RTP não seja verdade. Seria uma grande injustiça para com todos aqueles que, como a minha mãe, dedicaram uma vida aquela empresa.

Nota: Curiosamente, ao fim de 15 anos a trabalhar nas áreas de tecnologias de informação e comunicação, foi-me recentemente dada a oportunidade de trabalhar naquele que é o mais importante canal temático de televisão por subscrição em Portugal. Deve ser destino!
 
segunda-feira, setembro 15, 2003
  GARRAS DE LEÃO
Faleceu ontem vitima de cancro, aos 55 anos, o antigo guarda-redes leonino Vítor Damas.

Venceu dois campeonatos pelo clube de Alvalade e três Taças de Portugal, tendo envergado dezenas de vezes a camisola da selecção nacional de futebol . Participou em 52 jogos internacionais, com a camisola n.º 1 do Sporting, 6 na Taça dos Campeões Europeus, 16 na Taça dos Vencedores das Taças, e 30 na Taça UEFA. É totalmente improvável que alguém venha a bater este record.

Damas foi uma das minhas principais referências desportivas. Sem qualquer dúvida, foi ele que consolidou o meu desejo de ser Sportinguista.

O funeral teve lugar na tarde de hoje, em Oeiras, onde milhares de pessoas marcaram presença nesta última despedida a "Damas". Muitos ilustres ligados tanto ao Sporting como aos clubes rivais, não quiseram deixar de prestar a última homenagem aquele que foi um dos melhores guardas-redes nacionais.

Viva Damas! Viva o Sporting! Viva Portugal!
 
domingo, setembro 14, 2003
  SER DIGITAL
Há 3 anos atrás nascia para o grande público aquele que foi o projecto mais fascinante em que alguma vez estive envolvido.

A sua vida foi curta mas arrebatadora enquanto durou - como aliás, todas as grandes paixões.

O texto que se segue foi transcrito da carta de encerramento que, na altura, como responsável do projecto, enviei a todos os clientes:

“A loja on-line Submarino tornou-se, num curto espaço de tempo, numa referência no panorama do Comércio Electrónico em Portugal, reconhecida por uma base crescente e fiel de compradores on-line, bem como pelos cibernautas em geral que a elegeram como o melhor site de “ecommerce” em Portugal atribuindo-lhe o Prémio JetNet 2001 promovido pela Telepac.

Uma das grandes missões deste projecto foi levar a cultura e o entretenimento a todos aqueles que falam a língua portuguesa, através da disponibilização a preços acessíveis de milhares de livros, discos, DVDs, informática, jogos e brinquedos. Criámos uma base de dados de informação com milhares de sinopses, biografias, entrevistas, e notícias sobre o mundo do entretenimento. Este projecto poderia ter sido apoiado em Portugal no âmbito do desenvolvimento da Sociedade de Informação, porque era uma das mais importantes referências do comércio electrónico em Portugal, e porque representava um grande esforço no sentido de se desenvolverem conteúdos em língua portuguesa, mas infelizmente o financiamento previsto para cerca de mais dois anos foi, neste momento, impossível de obter dentro da empresa ou no mercado local.

Não tenho dúvida que desbravámos um caminho importante no panorama do comércio electrónico português, que agora pensamos ser irreversível. Existem hoje milhares de pessoas em Portugal que consideram o acto de comprar on-line muito mais interessante, simples e cómodo do que comprar no mundo físico.”

As mensagens de apoio que recebi como resposta a esta carta fizeram-me tomar uma decisão: iria continuar a apoiar, de todas as formas que me fossem possível, o desenvolvimento da interactividade e do comércio eletrónico em Portugal.

Desde então tenho trabalhado num projecto pioneiro a nível mundial de Televisão Interactiva. Ainda há um grande caminho a percorrer e haverá serviços que vão ser populares e outros sem qualquer sucesso comercial. Na próxima semana, irei ter o grato prazer de inaugurar publicamente um novo serviço de televisão digital: pela primeira vez em Portugal, os clientes da SportTV puderam escolher entre 4 jogos de futebol em directo da Liga dos Campeões da UEFA. Acredito sinceramente que este serviço vai ter uma grande adesão. A ver vamos.

Paralelamente, continuo o dar meu intrasigente apoio ao desenvolvimento do comércio electrónico. Se consegui despertar o seu interesse, consulte o site ACEP (Associação do Comércio Electrónico em Portugal).

Aproveito para deixar aqui um desafio: já que está na internet a ler este texto, abra outra janela e faça uma compra online!
 
sábado, setembro 13, 2003
  DERRADEIRO SMS
Fez hoje 5 meses que o Joaquim Hortinha faleceu num trágico e violento acidente de viação. A mãe do Joaquim morreu nesse mesmo acidente. No carro, estavam ainda a mulher do Joaquim e os dois filhos que assistiram a tudo.

Tive oportunidade de conhecer o Joaquim num seminário onde ambos fomos oradores. Mais tarde convidou-me para escrever um testemunho naquele que viria a ser o seu último livro.

O Joaquim foi um profissional do Marketing que acompanhou sempre de muito perto o desenvolvimento do marketing e das tecnologias de informação, em especial da Internet. Trabalhou em várias empresas, que eu me recorde na TV Cabo, Sapo, Oni e mais recentemente Águas de Portugal.

Pouco antes da sua morte, tinhamos estado a falar sobre uns projectos extremamente inovadores em que eu estava a trabalhar, que associavam a Televisão à comunicação interactiva por SMS. O Joaquim queria que eu arranjasse um tempo para ir falar do projecto a uma das aulas que ele dava na universidade pois estava fascinado com os conceitos de marketing que estavam a ser utilizados. Recordo-me que lhe disse que não era oportuno pois estávamos ainda numa fase muito embrionária do projecto, mas que assim que fosse o lançamento, que o avisaria. Lembro-me de ter dito qualquer coisa do género: mando-te um SMS quando fôr para arrancar!

Por ironia, soube da morte do Joaquim através de um SMS que me mandou a Paula, a mulher do Joaquim.
Na altura, não lhe consegui responder. Primeiro porque fiquei sem palavras. Depois, porque os 160 caracteres do SMS não me eram suficientes.

Joaquim: um abraço deste teu amigo. Para sempre.
 
sexta-feira, setembro 12, 2003
  MOTIVAÇÕES CRIMINOSAS
"Ministra dos Negócios Estrangeiros morre depois de ter sido esfaqueada numa loja".

Para quem lê esta notícia, sem lhe dar muita atenção, provavelmente a primeira coisa que lhe vem à cabeça é que tudo se passou num qualquer pais de criminalidade elevada.

Ora, não podia estar mais enganado.

Ao leitor mais atento, talvez o facto de se tratar de uma ministra (e não de um ministro) reduziria tremendamente o leque de países a tomar em consideração.

O pais em questão é a Suécia, e o episódio aconteceu na capital, Estocolmo, num centro comercial e em pleno dia. Tal como a maior parte dos seus colegas políticos, a ministra Anna Lindh não andava acompanhada de protecção policial e não resistiu às lesões no fígado e no estômago provocadas por inúmeras facadas. Não se sabe ainda quem foi o assassino e desconhecem-se as suas motivações.

A Suécia é um dos países mais seguros do Mundo. Tive a oportunidade de conhecer Estocolmo em 1998 e é de facto uma cidade que transpira segurança. Numa das noites fui convidado para assistir a um espectáculo em honra dos principais artistas suecos das últimas décadas: os ABBA, Roxette, Ace of Base entre outros. O espectáculo acabou já depois da meia-noite e porque a noite estava agradável (apesar de estarmos com temperaturas negativas), decidimos fazer o caminho a pé até ao hotel. Das duas uma: ou os ladrões não gostam do frio, ou a organização cívica dos suecos era realmente dissuasora da criminalidade. Em nenhum momento, senti qualquer tipo de insegurança. Estocolmo é de facto uma cidade muito bonita, particularmente asseada e extremamente segura que convida a longos passeios a pé ou de bicicleta.

No mesmo dia em que Anna Lindh era esfaqueada em Estocolmo, um colega da minha mulher foi atacado e assaltado quando parou num semáforo em Lisboa. Felizmente, ele não teve o destino fatal da ministra.

O que realmente me preocupa nisto tudo são as motivações dos criminosos envolvidos. Ou muito me engano ou a motivação do assassino da ministra era politica. Provavelmente um defensor do "não" à adesão da Suécia ao Euro que Nana Lindh tanto defendera. Talvez os suecos decidam ironicamente referendar a favor do "sim" no próximo fim-de-semana, como sinal de apoio à democracia que este crime atacou.

As motivações dos atacantes de Lisboa foram bastante menos nobres: roubar bens e dinheiro, provavelmente para a droga, ou como se tem assistido mais recentemente, para comprar roupa cara e outros artigos de luxo. Este tipo de crime é cada vez mais frequente e quem sabe quando nos tocará a nós ou alguém que nos é próximo.

Lisboa tem vindo a conhecer um progresso acelerado. Também graças aos grandes eventos que tem acolhido como a Expo 98 ou aqueles que se irão realizar em breve como o Euro 2004. Pessoalmente estou também a torcer que consigamos trazer a America's Cup. Infelizmente não temos conseguido acolher correctamente os grandes fluxos de imigrantes oriundos dos países de Leste. Também não tinhamos conseguido fazê-lo correctamente com muitos daqueles que vieram de África. Continuar a fazer tudo da mesma forma e não reunir condições necessárias para acolher estas pessoas sem as integrar socialmente é meio caminho andado para criar focos de criminalidade cada vez mais difíceis de resolver.

Somos responsáveis, como um todo, por resolver esta questão, certo? Certo.
 
quinta-feira, setembro 11, 2003
  REGRESSO ADIADO
A última vez que estive em Nova Iorque foi em 2000, já lá vão 3 anos.

Não sei porque é que nunca regressei. Posso honestamente confessar que não foi por medo de andar de avião nem por medo de mais ataques terroristas. É mais provável ser atacado por um carteirista em Lisboa.

Desde que conheço a minha mulher que todos os anos vamos a Nova Iorque passar uns dias de férias, normalmente fazendo uso do feriado do 5 de Outubro.

Quase sempre aproveitamos o nosso passeio americano para uma ida a um outro local, ora a Washington, ora à Flórida ou aonde nos apetecer. Lembro-me que, uma das vezes, fizemos uma viagem de quase 1.000 Km de carro para ver as Cataratas do Niagára. Quando chegámos fomos ao posto de turismo pedir informações e saimos de lá com um "Honeymoon Certificate" que assegurava que estavamos na capital mundial da Lua-de-Mel.

Neste pais tudo tem que ser sempre o maior, o mais alto, o mais largo, o mais "qualquer-coisa" do mundo. Confesso que ao contrário de outras pessoas, esta mania dos americanos nunca me chateou. Sempre admirei aqueles que sonharam um dia ir à lua e que o conseguiram fazer.

Foi com esta lógica das grandezas em mente que, em 5 de Agosto de 1966, os americanos lançaram as fundações das Twin Towers na cidade de Nova Iorque. Até 1974, foram orgulhosamente os maiores e mais altos edificios do mundo com cerca de 420 metros.

A última vez que estive nas Twin Towers foi em Maio de 2000. Lembro-me bem pois nesse dia tinha estado desde cedo num prédio das vizinhanças onde estava instalada uma software-house americana que desenvolvera um programa para a empresa onde eu trabalhava nessa altura. A apresentação a que eu estava a assistir foi interrompida por aquele que foi o maior ataque de um virús informático à escala mundial, o "I LOVE YOU".

Vivemos esse ataque informático com um grande frenesim: todas as pessoas tinham saido dos seus lugares e vinham para os corredores perguntar o que se estava a passar. Telefonei para os nossos escritórios em Miami, São Paulo, Buenos-Aires, Cidade do México, Madrid e estava tudo em baixo. Começámos a receber relatos de que o vírus tinha começado em Hong-Kong e que também lá tudo estava parado. Era um ataque de proporções mundiais que atingia todo o tipo de organizações, inclusivé governamentais. O mundo tinha parado por causa de um virus informático.

Como não conseguiamos fazer nada, fomos até ao McDonald's de Wall Street. Não se falava de outra coisa: Como era possível um ataque a esta escala? como era possível parar o mundo desta forma? Para aqueles americanos, já era algo surpreendente que Manhattan estivesse parada. Mais estupefactos ficámos quando soubemos, mais tarde, que tinha sido um puto a causar tudo isto a partir de um computador, se não me engano, em Singapura. Mal sabiamos nós que um ano depois, também à distância, a partir do Afeganistão, um homem orquestraria um ataque que iria mudar todas as nossas vidas e a face do local onde estavamos.

Naquele principío de tarde, a 11 de Setembro de 2001, estava nos escritórios da empresa onde trabalhava na altura, nas Avenidas Novas em Lisboa. Era hora do almoço e a minha mulher tinha-me ligado para confirmar a nossa ida para Nova-Iorque no principio do mês de Outubro, como era nosso costume. Eu não tinha ido almoçar nesse dia, e estava a perder a paciência porque queria usar a internet, e não conseguia. Pensei que fosse um vírus. Já só dizia disparates por causa do pretenso virús quando recebo um telefonema com uma notícia brutal: um avião tinha acabado de chocar acidentalmente contra o World Trade Center.

Então era por isso que estava tudo pendurado na internet: qual vírus qual carapuça. Estava todo o mundo a tentar saber mais informações sobre o acidente e os sites de informação estavam em sobrecarga. Na sala ao lado do meu gabinete, outros colegas já estavam a acompanhar o sucedido através da CNN. Minutos depois, um segundo avião chocava contra a outra torre: afinal não era um acidente.

As Twin Towers foram brutalmente destruidas nesse dia de Setembro, por um cobarde ataque terrorista que matou mais de 3.000 pessoas e mudou o mundo como o conhecemos hoje.

Não tenho vergonha de dizer que nesse dia chorei. Não consegui resistir à emoção que me causou o vôo quase que gracioso daqueles que decidiram dar o salto final das torres para o vazio. Nunca mais vou esquecer estas imagens.

Hoje, lembrei-me também daquele meu dia em Nova-Iorque, em que um puto informático parou o mundo. Naquela altura, cheguei a pensar que tinha assistido ao maior ataque de sempre à civilização ocidental. Como eu estava enganado....
 
quarta-feira, setembro 10, 2003
  MALDITA PROPAGANDA
Leni Riefenstahl morreu ontem em Munique aos 101 anos.

Para quem não sabe quem foi Leni (na realidade, Helene), esta noticia poderá causar aquela pontinha de inveja que surge sempre que ouvimos falar de quem conseguiu viver até tão tarde. Mas enganam-se todos os que pensam que Leni era uma pacata velhinha que viveu calmamente até aos 101 anos. Esta mulher teve uma das mais extraordinárias e ao mesmo tempo polémicas vidas de todo o século XX.

A primeira vez que fui tocado pela obra de Leni foi, curiosamente, no "lounge" de um aeroporto. Enquanto esperava pelo avião, peguei num grande livro ilustrado esquecido em cima de uma mesa: era o trabalho fotográfico de Leni Riefenstahl com as tribo Nuba no Sudão. São imagens de rara beleza, que mostram aspectos da vida dos Nuba e dos seus elementos. Fiquei impressionado com a força destas imagens e simultaneamente curioso pela forma como esta mulher parecia ter a necessidade de retratar a pureza desta raça.

De regresso a Portugal, quando me sentei pela primeira vez a ver televisão, eis que, por uma quase misteriosa coincidência, a vida de Leni é-me apresentada num documentário "a Maravilhosa, Horrivel Vida de Leni Riefenstahl". O que é que de horrivel poderia estar associado à  vida daquela mulher fotógrafa? quase tudo! Esta mulher tinha vendido a sua alma ao diabo.

Leni Riefenstahl tinha sido a realizadora da maior obra de propagada de sempre "O triunfo da Vontade", um documentário de cerca de 140 minutos sobre o II Congresso Nazi em Nurenberga, que retrata o Führer, Adolf Hitler, como ele queria ser visto: a dirigir milhares de pessoas, perfeitamente sincronizadas. Este filme, esteticamente belo e eficaz, iria tornar-se na futura referência para muitas das modernas técnicas de cinema. Infelimente foi também a obra de propaganda perfeita que consolidou o poder de Hitler e o seu designio de criar uma raça pura, com todas as consequências que hoje conhecemos.

Afinal, era esta a ligação escondida entre o documentário fotográfico dos Nuba em 1962 e o filme de propaganda de Hitler em 1934: ilustrar a pureza de uma raça.

Que ironia era esta que Leni nos queria mostrar? que relação poderia haver entre os brancos e louros arianos de Nuremberga e os negros do Sudão? Não pude deixar de ficar fascinado com esta mulher e a sua mensagem, apesar da repulsa que me causa tudo a que ela está associada no periodo Nazi.

Leni Riefenstahl tentou, após o fim da guerra, convencer os aliados que era simplemente uma "artista ao serviço da sua arte". Mas niguém ficou convencido e Leni foi renegada como cineasta.

Talvez se tenha tentado redimir com a reportagem dos Nuba. Mas que é dificil esquecer a quem e a quê serviu no passado, lá isso é.
 
terça-feira, setembro 09, 2003
  PRAXES CRIMINOSAS
O enxoval de um rapaz do Colégio Militar custa cerca 2.000 Euros (400 contos à moda antiga). Desde a farda aos sapatos, passando pelas camisas e pelas meias e tudo o resto que um rapaz precisa para fazer a sua vida num colégio interno que prima pelo rigor e disciplina militar.

Para um menino que se quer fazer um homem no colégio militar, os primeiros tempos não são fáceis: as saudades de casa e as exigências de uma vivência militar são os grandes inimigos dos primeiros dias. É nesse periodo que, após um primeiro contacto com as instalações, surgem as praxes: a ‘noite dos fantasmas’, em que os novos alunos recebem a ‘visita’ das figuras ilustres do Colégio. Depois, o tempo vai passando e todos se habituam.

Eu não fui aluno do Colégio Militar, mas conheço alguns antigos alunos, e sem excepção todos me falam, com orgulho, da grande camaradagem e o apoio mútuo que existia no colégio e que se mantém após a saida. Admiro muito estes laços de honra, fidelidade e respeito que se criam entre os antigos alunos do Colégio Militar.

De súbito, como que acordado para as outras realidades, sou confrontado com um caso terrivelmente diferente e violento: as praxes na Casa Pia.

No Expresso, um antigo aluno da Casa Pia relata as praxes que se faziam (ou ainda fazem): Os alunos mais velhos, violam os caloiros. Foi o "direito" que conquistaram. Também eles já passaram por isto. Os caloiros vão para os duches para serem "rodados" pelos outros alunos agora que os chefes já lhes "tiraram a virgindade".

Este relato brutal e chocante da vivência destes rapazes, levanta-me uma questão inquietante: o que distingue os meninos da Casa Pia dos meninos do Colégio Militar: são os pais desses meninos? são os educadores e formadores desses meninos? são os meios e as condições proporcionadas a estes meninos? Serão estes meninos tão diferentes do outros meninos?

Somos nós, como um todo, culpados por tudo isto? Devemos ser!
 
  A MOLEIRINHA
Já fiz um filho. Três, na realidade.

já plantei uma árvore. E umas tantas flores.

Mas ainda não escrevi um livro. É verdade que já escrevi uns artigos para algumas revistas e jornais. E escrevi um capitulo para um livro de um amigo. mas não escrevi um livro meu. só meu....

Neste momento da vida, escrever aqui é o que mais se assemelha a escrever um livro, mas sem o compromisso de ter que prestar contas a ninguém.

Posso escrever, sobre o que me apetecer. Quando me apetecer.

Não quero assumir o compromisso de que vou escrever todos os dias. Mas hoje, que estou a começar, quero pensar que vou escrever todos os dias.

É estranha esta vontade. Nunca tive um diário. Na verdade, nunca me apeteceu escrever.

O que é que me deu agora, depois dos trinta, a caminho dos quarenta, para querer escrever?

e ainda por cima, aqui. Onde outros podem ver o que escrevo?

E que ideia esta de escrever sobre "as coisas que me dão cabo da moleirinha"? MOLEIRINHA?

Escolhi este nome porque uma das coisas que sempre me impressionou nos meus filhos, foi passar a mão pela cabeça deles e sentir a "moleirinha". Sempre me pareceu que não os estava a magoar mas que era algo que eles sentiam. Depois quando nos tornamos adultos, a "moleirinha" fecha. Como se de uma porta se tratasse e que nos protege das coisas que nos rodeiam.

Todos os dias somos confrontados com assuntos que nos tocam na "moleirinha". Não nos magoam mas que os sentimos, lá isso sentimos.

A "moleirinha" devia ficar sempre entreaberta. Para sermos mais humanos.
 
AS COISAS QUE ME DÃO CABO DA MOLEIRINHA

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